Royalties não melhoraram vida em municípios produtores, diz estudo


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Os royalties do petróleo não têm sido suficientes para melhorar a qualidade de vida da população nos principais municípios produtores, mostra um levantamento que vem sendo coordenado pelo professor Cláudio Paiva, do Departamento de Economia da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Segundo ele, os royalties "trouxeram a corrupção", diante da falta de um marco regulatório sobre a aplicação dos recursos.


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"Isso não quer dizer que tenhamos de tirar os recursos desses municípios. Temos é que ter um controle forte sobre esses recursos", diz o pesquisador.

Com foco nas principais cidades produtoras de petróleo, entre elas Campos e Macaé, no litoral norte do Rio de Janeiro, o Departamento vem analisando como os recursos do petróleo estão sendo aplicados nessas cidades - e seus efeitos na qualidade de vida.
Um dos estudos mostra que, desde 2004, o município de Campos gastou R$ 18 milhões em convênios com quatro hospitais da cidade, mas que o número de internações manteve-se o mesmo no período.

Um outro levantamento indica um crescimento elevado nos gastos com Cultura - uma rubrica difícil de ser auditada, segundo Paiva.
Em Quissamã, por exemplo, o gasto chega a R$ 618 per capita, enquanto em São Paulo esse valor é de R$ 19.
Na avaliação do professor da Unesp, a redistrubição dos royalties para todo o país como aprovado na Câmara "não é solução para o problema".

"Não existe uma política deliberada de aplicação dos royalties. Como os municípios não têm qualquer forma de planejamento, esse dinheiro vai para o ralo", diz o pesquisador.

A seguir, trechos da entrevista.

BBC Brasil - Que impacto os royalties do petróleo trouxeram para a região?

Paiva - Nos municípios analisados, sobretudo em Campos e em Macaé, que recebem a maior quantidade de recursos, a gente não viu melhora significativa na saúde, nem na habitação. Há falta de planejamento, desvio de recursos públicos. Vários prefeitos na região foram cassados. Por não ter um controle social adequado, um marco regulatório, o dinheiro dos royalties, na verdade, trouxe com ele a corrupção. Essa é questão-chave. Isso não quer dizer que tenhamos de tirar os recursos desses municípios. Temos é que ter um controle forte sobre esses recursos.

BBC Brasil - Isso quer dizer que royalties não são sinônimo de desenvolvimento?

Paiva - No Brasil, pelo menos, não é. Em outras partes do mundo, é. Nesse momento, temos uma grande chance de ter um novo milagre econômico com os recursos do pré-sal. O fato é que não existe um projeto nacional de desenvolvimento, ou seja, aquilo que o governo federal aponta como foco de investimentos... Isso não tem. Não existe uma política deliberada de aplicação dos royalties. A emenda Ibsen, por exemplo, diz: vamos repartir, então todo mundo vai ganhar uma pequena parte dos royalties do pré-sal. No entanto, os municípios não têm qualquer forma de planejamento. Esse dinheiro vai para o ralo. Vai para contratação de funcionários, vai para corrupção, enfim, destinos que não melhoram a situação da população desses municípios.

BBC Brasil - O debate sobre a redistribuição está errado?

Paiva - É um debate ainda inócuo, de quem ganha e quem perde. O debate é de como os roaylties podem reduzir a desigualdade regional no país. O Nordeste precisa de recursos, sim. Mas não é simplesmente tirar recursos do Rio de Janeiro, que gera um desequilíbrio no pacto federativo. Temos que estabelecer regras de transição. Enquanto ficar nessa briguinha... Fazer um projeto desse, de redistribuição, é justo. Ninguém vai falar que não é justo. Só que isso é incostitucional. Precisa de fato de um plano nacional de desenvolvimento. Só depois a gente pode pensar em redistribuição dos royalties.

Me parece precipitado você tentar resolver o problema dividindo isso para todos os municípios. Será que fazer a simples divisão dos recursos para outros municípios vai resolver o problema das desigualdades? Isso precisa de tempo, precisa ser estudado, olhar as experiencias de municípios que já recebem muitos royalties. E também precisamos pensar na manutenção do pacto federativo. Não se pode colocar um assunto desse em votação em ano de eleição. É obvio que os deputados estão preocupados com o que seus eleitores estão pensando.

BBC Brasil - O senhor defende o uso dos royalties como ferramenta de redução das desigualdades?

Paiva - Já que o recurso é nacional, já que temos uma grande chance, com os recursos do pré-sal, de ter um novo modelo de desenvolvimento, deveríamos pensar em como criar fundos para reduzir as desigualdades regionais. Precisamos olhar para as experiências atuais e tentar compreender o que está sendo feito com os royalties do petróleo. Ou seja, será que as políticas publicas executadas a partir dos royalties têm melhorado a qualidade de vida da população? Eu não tenho certeza se isso melhorou. Pelo contrário, os resultados até agora mostram que a melhora não foi tão fundamental como a gente imaginava. Outros municípios brasileiros têm políticas públicas muito melhores do que a de Campos e Macaé, por exemplo, que são os municípios que mais recebem royalties do petróleo.'

BBC Brasil - Um dos argumentos para uma maior cota dos royalties às cidades produtoras é de que elas precisam ser compensadas pelo fato de que um dia o petróleo vai acabar. Além disso, essas localidades teriam que gastar mais com infraestrutura e proteção ambiental...

Paiva - Na verdade, a discussão dos royalties já perdeu relação com o fato de o bem ser finito. Esse é um debate muito complicado. Há 30 ou 40 anos as pessoas falam que o petróleo é escasso. E aí a gente vai descobrindo o pré-sal, outras fontes, e as reservas estão aumentando cada vez mais. O debate não está mais aí. O debate dos royalties é uma compensação financeira, que já foi julgada pelo Supremo, das mudanças feitas pela Constituição de 88, da não cobrança do ICMS na origem dos recursos do petróleo. Isso faz toda a diferença, inclusive para inviabilizar a emenda Ibsen.

BBC Brasil - E quanto à compensação em função de um maior risco ambiental?

Paiva - Esse argumento não faz sentido. O argumento final é o da compensação pelo ICMS, definido pelo Supremo. No caso da Bacia de Campos, estamos falando de plataformas que estão a 150, a 200 quilômetros da costa. Não é questão de impacto ambiental. Boa parte desses recursos e a totalidade, no caso do pré-sal, vem de alto-mar. O debate não é ambiental, é uma compensação financeira mesmo.

BBC Brasil - Mas essas cidades, em tese, têm que lidar com alguns problemas em função da exploração do petróleo, não?

Paiva - Não. No caso de Macaé, houve um crescimento explosivo da cidade. E você multiplica muito rapidamente a população. Essa pessoa acaba indo para a periferia, vai ocupando áreas de impacto ambiental. E o prefeito não coibiu. E muitas vezes esses lugares foram curral eleitoral. Todos os municípios da região são dominados por alguns grupos. Claro que falta infraestrutura. Mas todas as coisas que foram feitas para atrair esses investimentos para região, foram investimentos federais. A pesquisa de petróleo é federal. E quem está colhendo os benefícios são essas cidades. Tanto em Macaé, como em Campos, o que se tem é uma falta de planejamento urbano.



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